sexta-feira, abril 14

(vazio.)

É assim.
Sou tudo para ti.
És uma parte do mundo para mim.
E assim o foi desde todos os tempos,
desde o início de todos nós.

A minha voz, sozinha, acordava-te a noite
Cansava-se os músculos
Sugava-te a juventude morena.
Foi assim que nasceram os cabelos brancos!
E nos entretantos da minha vontade
As rugas nos solavancos da tua face.

Agora precisava mais de que um abraço
Mais do que a tua presença
E da tolarente bonança do teu sorriso.
Precisava de mais: só tu já não chegas.
Quais são as tuas respostas?
(vazio)

O teu amor é eterno e infinito
O teu abraço quente e confortável
A tua voz terna, olhar amável
Mas a comprensão?
(vazio)

E o rio que se impõe entre nós cresce
Com cada palavra que pensas, e não dizes
Só palavras trocadas, simples: honestas
Podem fazer-nos felizes.
A rima é pobre, como o teu entendimento.

És no entanto, inteligente
Mas de um contentamento
Apenas com os sorrisos falsos que esboço
Para teres uma tarde de sol.
Talvez os teus problemas sejam de mais no rol dos teus
Talvez procure noutro os tais adverbios que procuro.
Mas nunca será o mesmo.

Porque eu sou parte de ti
E não ao contrário.
Tu, sozinha, devias entender.
Mas estico o braço e choro e rogo
Num abraço tu sorris
Fechas a porta e esperas que passe.
(vazio)

Eu sei que nunca foste assim
ou esqueceste
nunca tiveste duvidas a mais
ou desgostos a mais
ou uma necessidade brutal de filosofia
Para ti: dia a dia se vivia
Como o dia-a-dia. Até morrer

Será que custava-te muito compreender?
(Eu não compreendo. Vazio.)
Custava muito abrir a porta e ouvir?
(Eu não escuto. Vazio.)
Não podias olhar para mim, e explicar?
(Não há explicação. Vazio.)

Nasceste e sabias que tinhas de viver. Comeste. Cresceste e sabias que tinhas de crescer. Aprendeste. Respeitaste e sabias que tinhas de ajudar. Amadureceste. Trabalhaste e sabias que tinhas de te esforçar. Estudaste. Casaste e sabias que tinhas de procriar. Trabalhaste. Aceitaste e sabias que tinhas de viver.
Eu precisava que soubesses. Porque quando te disse, foi como se entre nós houvesse um rio, foi como se as palavras se afogassem e a água as forçasse ao seu fundo escuro. Não chegaram a ti. Não as salvaste. Não me salvaste a mim. E a mágua persite: persisterá sempre enquanto sobre ti existir esse mando vazio de indiferença maternal: um brilho frio no teu amor.
É isso que é amor sem compreensão - vazio.
E aceitar não é o mesmo que compreender.
E saber não é o mesmo que compreender.

Já não sei se o vazio és só tu, ou o rio, ou o ar à nossa volta, ou eu mesma. Queria verdadeiramente ser vazio e desaparecer, para não estorvar mais a tua face alaranjada e os teus problemas negros.
E queria, que uma versão qualquer de ti (que não posso exigir por te amar assim como és) lesse algum dia o que escrevo só porque lhe apetecia. Só porque sabia que era meu. Só porque adoraria lê-lo. Mas não, claro que não. (vazio.)
Só porque tudo o que escrevo é em desejo da tua aprovação.

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