Definhas
Mostra-me só a outra face da tua face. O desenlace do rosnar canino a um sorriso claro, com os olhos deleitados numa coisa qualquer (já nem importa). Mostra-me só a porta da tua felicidade. O teu rosto iluminado por um atrelado qualquer de pequenas e grandes coisas que tu aches belas. Nem precisas de dizer que vale a pena, nem é um sorriso que te vai comprar o bilhete de volta à vida! Eu bem sei que falta tudo, que tudo prende cada centímetro da tua pele a uma realidade fétida que desgostas: e já o vi nos teus olhos verde-acinzentados, que nas curvas da tua alma chove demais para que alguma gota de desespero minha acorde um sorriso nas tuas rugas. Mas eu nem espero ver mais aqueles sorrisos claros da minha infância. Já nem acredito que alguma vez tenham existido, a minha fé na tua felicidade torna-se num misto de saudade com uma incrédula negação. E resigno-me assim, à espera. Espera de quê, pergunto ao lado errado do meu retórico discurso: À espera que fujas? Que te isoles mais um pouco e te enterremos como ermita, expulsando-te? Pensar-te morto é talvez mais fácil que imaginar-te prisioneiro do nosso querer.
Só queria que sorrisses. Mas já que isso não é possível peço desculpa: por mim, pelos outros, pelo mundo: pela nossa existência, manias e ideias! Por tudo o que a nossa soma resulta e te aborrece tão profundamente. E liberto-te, nunca mais sou eu contigo, peço-te apenas num esforço vão: poderias mostrar-me o esboço húmido do outro lado da tua face?
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