Ela queria contar a alguém, mas tinha medo... medo que não a ouvissem, medo que não prestassem atenção como deviam e ao que deviam, medo que a fizessem ficar ainda com mais medo. Medo que eles a ouvissem. E então não dizia nada, e o silêncio traía a sua confiança de cada vez que a visitavam. Atrás das sombras via outras sombras que ninguém via, e continuava a falar, baixinho (tão baixinho que o som mal se escutava na sua própria mente) para que não se enfurecessem com ela. Ás vezes eles pediam-lhe coisas... e ela acedia, normalmente, temerosa. Não pensava muito nisso.
Um dia contou. E todas as coisas pareceram diferentes. Tão simples, tão fáceis, tão óbvias. Procurou ajuda e foi ouvida, amparada, ajudada... e eles tornaram-se inertes, silenciosos: eram somente presenças na rua, fantasmas pregados ao chão. Eram sombras negras e ela evitava-os, confundindo-as com as cascas escuras das árvores. Viveu feliz... até que viu o seu rosto. Passou a pressenti-las antes de as ver - sem as ver. Ouvia as suas lamúrias e via, por trás do buraco negro das suas faces, dois olhos cinzentos mas brilhantes, rugosos e vazios. Já não a fitavam somente. Entravam na sua mente, brincavam com ela. O medo voltou, cada vez mais forte. Ela acreditou que não e eles tomaram-na como um pedaço de carne oca e prenderam as garras aos seus braços. Ela fugia, corria e esquivava-se dos crentes na ajuda, pois o pior havia voltado. Os cheques haviam sido rasgados e a única fé restaurada, mas mesmo assim nada chegava para que a largassem. Fugia do mundo, fugia deles que o habitavam. Via-os e sabia o que os prendia aos lugares. Pensou que novos refúgios a salvassem dos lugares rotineiros; mas a lua voltou e nunca mais o cheiro de incenso vermelho largou os seus poros. Descobriu finalmente que conseguia fingir que não existiam e esquece-los, por instantes, quando estava acompanhada. Era essa a solução... nunca estar só - mas estar só eternamente.
terça-feira, fevereiro 7
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